OMS alerta que as mulheres têm mais chances do que os homens de desenvolverem transtornos, como ansiedade e depressão, e estão sobrecarregadas com cuidados com parentes e a casa
Lúcia Rodrigues
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), as mulheres têm mais chances do que os homens de desenvolverem transtornos mentais, como ansiedade e depressão. Elas também estão mais propensas a sofrerem de males relacionados ao estresse, como o do pânico.
Equilibrar carreira, família e vida pessoal é um desafio para as mulheres e a corresponsabilidade das tarefas domésticas pode aliviar essa carga e evitar o estresse crônico e problemas de saúde mental.
Com o objetivo de debater o tema, o Conselho Superior Feminino (Confem) da Fiesp reuniu, na sexta-feira (20/9), autoridades e especialistas no assunto.
Para Marta Lívia Suplicy, presidente do Confem, a saúde mental é tão importante quanto a saúde física e é essencial para o bem-estar geral. “No pós-Covid, fomos apresentadas às doenças silenciosas que, com certeza, já convivíamos com elas e já mascarávamos pelas nossas rotinas e necessidades”, disse Marta Lívia.
De acordo com Laís Abramo, secretária nacional de Cuidados e Família do ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), a sobrecarga de trabalho de cuidados é um importante fator de esgotamento e problemas de saúde mental das mulheres.
“O trabalho de cuidados exige tempo e é mal pago, quando é pago. É um trabalho invisível e muitas vezes nem é considerado trabalho”, disse Abramo, lembrando que este tipo de atividade é, predominantemente, relegado às mulheres.
A secretária corrobora esse pensamento com dados de uma pesquisa feita pela Think Olga (2024) no Brasil, que mostra que a sobrecarga de trabalho doméstico e a jornada de trabalho excessiva foram o segundo fator de maior impacto na saúde emocional das entrevistadas, atrás apenas das preocupações financeiras.
Dez países da América Latina (Brasil não está incluído) fizeram um cálculo de quanto custaria (em porcentagem do PIB) comprar no mercado esse trabalho que é feito nos domicílios de forma gratuita e invisível pelas mulheres.
Em sete desses dez países, o valor econômico do trabalho não remunerado representa mais de 20% do PIB e, em todos os casos, as mulheres realizam mais de 2/3 dessa contribuição.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que as mulheres passam, em média, 21,3 horas semanais nos afazeres domésticos, enquanto os homens utilizam 11,7 horas.
Essa sobrecarga de trabalho afeta a vida profissional delas. “É uma poderosa barreira para a entrada e permanência das mulheres no mercado de trabalho”, afirma. Segundo ela, para haver maior equilíbrio, é preciso políticas públicas e políticas integradas.
Abramo disse ainda que um dos princípios da Política Nacional do Cuidado é a corresponsabilidade social e de gênero e que o papel do setor privado é fundamental. E citou algumas medidas que podem ser adotadas pelas empresas favoráveis ao equilíbrio entre o trabalho no mercado e às responsabilidades familiares e de cuidado.
Entre elas, ampliação da licença maternidade (no Brasil é de 120 dias) inferior ao recomendado Organização Mundial da Saúde (OMS), que preconiza aleitamento materno exclusivo até os seis meses dos bebês; possibilidade de extensão da licença paternidade para 15 dias, compensada por incentivos fiscais através do programa Empresa Cidadã; discussão de outros tipos de licença para cuidar de familiares idosos, com deficiência, doença de longa duração.
Transtornos mentais
Priscila Perdicaris, secretária-executiva da Secretaria de estado de Saúde de São Paulo, afirmou que os transtornos mentais estão entre as principais causas de afastamento do trabalho no Brasil. O INSS concedeu em 2023, 288.865 benefícios por incapacidade devido à disfunção da atividade cerebral e comportamental – aumento de 38% em relação a 2022.
A Secretaria de estado de Saúde de São Paulo promove ações para apoiar a implantação e implementação de ações de promoção e cuidados da saúde mental das suas colaboradoras.
Algumas dessas ações passam por trabalho em grupo com profissionais dos hospitais, discussão a partir da contextualização da realidade local e construção conjunta de estratégias de promoção e cuidados em saúde mental, apoio psicológico e psicossocial e encontros para discutir sobre as interfaces entre saúde mental e o mundo do trabalho.
Luciana Vendramini, atriz e apresentadora, foi diagnosticada com Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) em 1997, e sofreu por muitos anos até aceitar o diagnóstico e começar o tratamento.
Ela encerrou a reunião do Confem com um depoimento franco e emocionante. “Fiquei quatro anos sem sair de casa, morte em vida. Certa vez, fiquei oito horas no banho. Eu não aceitava médicos nem medicamentos. Cheguei a pesar 32 quilos. Fui internada”, contou.
O TOC é uma doença na qual a obsessão se relaciona ao pensamento e a compulsão se relaciona ao comportamento. Pensamentos e imagens vêm à tona contra a vontade da pessoa, gerando desconforto e ansiedade. Para aliviar esse estado, a pessoa reage com comportamentos repetitivos.
As causas da doença ainda não estão esclarecidas, mas há grupos de pacientes que apresentam componentes genéticos, outros não. Não há cura, mas há tratamento com sucesso que devolve ao paciente toda a qualidade de vida.
Para finalizar, Vendramini adverte. “Quando a mente cala, o corpo fala. Ouça seu corpo e aceite o tratamento, para mim foi medicação e terapia. Hoje estou ótima e ajudo as pessoas que têm TOC ou outras enfermidades”, disse.
A reunião do Confem contou ainda com a presença de Larissa Eloi, CEO do Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do estado de São Paulo (Sindhosp), e de Bruna Fesneda, coordenadora de Bem-Estar da Basf para a América do Sul.